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domingo, 4 de novembro de 2012

"Rádio comunitária é um instrumento revolucionário"



Em entrevista ao Boletim do NPC, Dioclécio Luz fala sobre o que ele considera o veículo de comunicação mais revolucionário: a rádio comunitária. Trechos da entrevista:


Você diria que a rádio comunitária é potencialmente revolucionária?

Dioclécio Luz - Quando ela não tiver esse espírito revolucionário, ela deixa de ser comunitária. Se ela passa a copiar a comercial, ela deixa de ser comunitária. A Rádio tem um potencial para mudar o planeta. Mas como nós não temos certeza de como vamos fazer essa transformação ficamos titubeando e aí acabamos copiando as emissoras comerciais. É um problema cultural. O brasileiro não tem cultura para assumir um veículo como esse por todas as questões sociais existentes em nosso país. A rádio comunitária é uma rádio do trabalhador, mas não é só isso, as pessoas não perceberam ainda a capacidade de transformação da rádio. 

Você acha que o tema das rádios comunitárias é tratado de maneira satisfatória nos cursos de comunicação?

Dioclécio Luz - Hoje, em algumas faculdades, há bons professores dessa área. Mas os estudantes são formados para trabalharem na TV Globo, que é considerada o ideal de jornalismo. Não se consideram diferentes possibilidades de se fazer jornalismo, como por meio da rádio comunitária. A rádio comunitária precisa ser vista não como um veículo de esquerda, mas como um instrumento de comunicação crítica. Eu participei como jurado de um concurso de vídeos sobre direitos humanos e 99% dos vídeos concorrentes reproduziam o modelo global [da Rede Globo]. Será que não tem outras formas de fazer? Se não existe, que inventem! Ora, o mundo não acabou. 

O que não podemos deixar de saber sobre rádios comunitárias?

Dioclécio Luz - Que este veículo é original, tem que ser original, por natureza e princípio. Quando trabalhamos em uma rádio comunitária temos que desaprender um monte de coisas. Não existem duas rádios iguais, e ainda bem que não. Quando a igreja católica, por exemplo, toma posse de uma rádio comunitária é um crime, ela está impedindo que a população aprenda a usar o veículo mais revolucionário que existe. 

Agora, aumente o volume... A boa rádio comunitária é a que cumpre todos estes requisitos. Ou que, pelo menos, tenta segui-los. Errar não é desumano. Muitas rádios que estão no ar hoje no Brasil se dizem comunitária. E não são. Não são porque não cumprem nenhum desses princípios, nem querem cumpri-los. São rádios que pertencem à Igreja, ao empresário, ou é dominada pelo político. Todos esses setores podem ter sua rádio, mas, por favor, não a chamem de comunitária. Comunitária é outra coisa.

Mesmo o fato de uma rádio ter a Autorização do Ministério das Comunicações para funcionar não faz dela uma rádio comunitária. Não é um papel que faz uma rádio comunitária. O papel é o menos importante.  Do mesmo jeito que não é a carteira de identidade que garante a existência de uma pessoa. A carteira de identidade é somente um documento.

Se a rádio está de fato a serviço da comunidade, se pertence à comunidade, se promove todos os princípios citados, ela é comunitária. Um papel do cartório de Brasília (o MC) vai apenas sacramentar esta verdade. Igualmente a rádio de um espertinho pode até se auto-intitular comunitária, pode até mostrar a autorização oficial pregada na parede, mas não é comunitária.

Neste passo, o autor transcreve dicas de José Ignácio Lopez Vigil, ex-presidente da Associação Mundial das Rádios Comunitárias (AMARC), de como produzir um bom programa de rádio e a manifestação de opção pelo debate e não pela censura.

"(...) Eu me atreveria a dizer que o polêmico é a nova cara do educativo. Na Nicarágua, durante dez anos de revolução, os companheiros foram tímidos para fazer debates na TV. Sentiam insegurança diante deuma direita que dominava melhor que eles a retórica, argumentação, ainda que fossem argumentos falsos. Dizia-se: e se nos metem o gol?

Poucos meses antes das eleições de 1990, a televisão sandinista lançou, pela primeira vez, programas de debate aberto, ao vivo. E esses espaços foram uma escola de pensamento, uma escola política melhor que muitos discursos dos dirigentes. A experiência mostrou a eficácia desses formatos.

Em nossos programas se ouvem opiniões contrárias às nossas? Nas emissoras cristãs se ouvem as vozes dos não-crentes? Os machistas falam nos espaços feministas? A direita fala no espaço da esquerda? Temos sido pluralistas de boca mas sectários e doutrinadores de fato.

Preferimos dar soluções, tirar conclusões, impor nossa opinião sobre as coisas. Temos que passar da cultura da censura para a cultura do debate