Laurindo Leal Filho |
A presidenta Dilma Rousseff deu um sinal político
“positivo” ao impulsionar a regulamentação econômica da mídia, declarou o
professor Laurindo Leal Filho, elogiando uma eventual nomeação de Ricardo
Berzoini para o Ministério das Comunicações. Ele opinou também que a Empresa
Brasil de Comunicação (EBC) precisa contar com uma rede própria que se
capilarize em todo o país, a fim de divulgar um discurso alternativo ao das
oligarquias midiáticas.
O professor aposentado da USP (Universidade de São
Paulo), ex-ouvidor da EBC e apresentador do programa VerTV argumentou que a
grande mídia, financiada com recursos milionários estatais, segue em uma
estratégia golpista contra a Dilma. Além disso, propôs também a criação de um
jornal independente dos grupos concentrados, seguindo a experiência de Getúlio
Vargas nos anos 1950 e mencionou que a EBC poderia observar a experiência
argentina, onde a televisão pública transmite partidas de futebol gratuitamente
e a todo o país. “O Estado tem recursos, e conta com a estrutura da EBC... o
que é necessário é vontade política”, resumiu Laurindo em entrevista à Carta
Maior.
Qual sua opinião sobre uma possível nomeação de
Ricardo Bersoini como ministro de Comunicações?
Ricardo Berzoini é uma pessoa que demonstrou ter
posições bastante claras sobre a democratização da mídia, é alguém com longa
atuação dentro do PT, que está completamente identificado com o ideário e os
princípios do partido. Além disso, tem um plus por pertencer ao sindicato dos
bancários que, como os outros sindicatos, desenvolveram uma experiência
importante de comunicação alternativa à mídia hegemônica.
Em 2010, a presidenta Dilma falava que o único
controle é o controle remoto. Agora, nessa campanha, ela falou da necessidade
de regulação econômica da mídia. Ela mudou?
Essa frase do controle remoto havia sido lançada
pelo comediante Jô Soares para atacar a proposta de democratizar a mídia. Esta
jargão foi repetido pela mídia privada como uma forma de atacar qualquer tipo
de reforma. É um jargão efetivo que pega muito entre as pessoas comuns.
Infelizmente, em 2010, a presidenta Dilma e alguns ministros de seu governo
usaram essa frase em uma tentativa de se aproximar da mídia privada. Mas,
atualmente, Dilma já arquivou essa expressão porque ao longo do governo
comprovou que é uma ideia incorreta, e começou a falar de regulamentação
econômica da mídia. Acredito que isto foi um avanço extraordinário, muito
positivo. Ela evoluiu muito, compreendeu que isso do controle remoto era uma
bobagem, porque, no Brasil, o controle remoto serve somente para ver a mesma
ideologia repetida em vários canais com cenários diferentes. A presidenta deu
um grande passo ao esquecer a ideia do controle remoto. A começar pela ideia da
regulamentação econômica, que é algo muito mais sério, acredito que ela esteja
convencida dessa ideia. Mas devo dizer que a regulamentação econômica não é
suficiente.
Trégua com a Globo: impossível
Em 2003, Lula acreditou ser possível uma trégua com
a Globo. E depois, a Dilma também achou que dava para ter uma convivência
harmônica com o grupo Marinho. Acha que guardaram essa expectativa?
É muito difícil entrar na cabeça dos presidentes
Lula e Dilma, mas minha análise é que existe nas autoridades em geral o que
chamei de “síndrome do Jango”, que é um certo temor diante da Globo e de outros
grupos. Claro que é justificado porque os governos populares foram
historicamente ameaçados pelos meios de comunicação.
Acredito que tanto o Lula em 2003, como a Dilma em
2010, temeram que 1964 se repetisse, quando a mídia influenciou muito na
derrubada do presidente João Goulart pelos militares. Isto está presente de
forma inconsciente nas autoridades democráticas.
Outro assunto, pouco estudado, é que os políticos e
também a maioria dos cidadãos se relacionam com a mídia com uma atitude de
século XIX. Curvam-se demasiadamente diante do poder da mídia. Fica
estabelecida uma relação de subordinação, algo quase psicológico.
Isto se nota desde a atitude de um dirigente de
bairro, no comportamento de um dirigente sindical de base, até as mais altas
autoridades do país. Para todos eles, é importantíssimo aparecer por 30
segundos no Jornal Nacional. É uma relação psicológica doentia, as autoridades
não conseguem se comportar de igual para igual com a Globo, e esse medo explica
porque faltou ousadia nas políticas de comunicação.
Eu me lembro de algumas pessoas do governo Lula
dizerem que a Globo era uma questão de Estado. Ou seja, para eles, não era
impossível fazer valer a autoridade do governo democraticamente eleito diante
de uma empresa privada. Eles acreditavam que era possível ser aliado da Globo,
e ficou provado que isto não é possível. A Globo é adversário dos governos de
Lula e Dilma.