Que têm em comum Alceu Valença, Aldir Blanc, Egberto Gismonti, João Bosco, Moraes Moreira, Dori e Nana Caymmi, Paulo César Pinheiro, Roberto Menescal, e a ex-ministra da Cultura, Ana de Holanda? Todos eles colocam o direito dos artistas de lucrar com as sua obras acima de qualquer interesse da sociedade de receber, gozar e inovar a cultura. Insistem que qualquer rádio ou televisão que difunde as suas criações, deve pagar o que o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) exige. Como informou uma nota na Revista Fórum junto com um total de 800 artistas assinaram um documento com o nome “Vivo de Música” na semana para defender “o nosso negócio”.
Pode soar estranho isso, sobretudo porque o ECAD foi “condenado por formação de cartel na cobrança de direitos autorais.” O ECAD fixou custos e multas como se fosse uma agência estatal, sem nenhum controle da sociedade. Porém, ao invés de discutir como poderia se modificar o atual regime de direitos autorais e estabelecer um novo compromisso social acerca da produção e reprodução da cultura, o grupo “Vivo de Música” coloca-se numa postura de justiceiros e aponta com o dedo na direção da mídia comercial e da ABERT, o verdadeiro cartel em defesa da “propriedade de alguns poucos poderosos.”
Que disputa mais patética. Porém, deve-se mencionar que nem todos que vivem da música e foram convidados para assinar a carta o fizeram. Gilberto Gil, Caetano Veloso, Leoni, Chico Buarque e Jorge Mautner desistiram de por o seu nome no documento, porque acham que “as pessoas têm queixas e dúvidas. Não podemos fazer da gestão do direito autoral um clube fechado. Por isso, temos discutido a questão da fiscalização do ECAD e também as mudanças na Lei do Direito Autoral.”
A AMARC Brasil e Artigo19 já contribuíram com uma proposta concreta a esse debate. No ano passado entraram juntos com uma ação jurídica chamada amicus curiae, para que se garanta a não cobrança de direitos autorais nas rádios comunitárias. São principalmente dois argumentos que sustentam essa revindicação. Primeiro, “orientando-se pelos padrões e legislação internacional sobre liberdade de expressão e acesso à informação [que] entende as rádios comunitárias como sendo veículo democratizante, que exercem papel de interesse público […] não havendo, para tanto, exploração lucrativa de atividade econômica.” É por isso que a cobrança de taxas a título de redistribuição é questionável, porque reconhecer globalmente a autoria de uma música ou outra obra não legitima cobrar polo seu uso em qualquer situação.
E o ECAD? O justiceiro ficou em evidência ao passar contas ilegítimas e agora tem que pagar uma multa de R$ 32 milhões até o día 26 de maio. Lendo isso, dificil não pensar no refrão dos Mutantes; “Paga lo que debes. El Justiciero cha, cha, cha. Que otra cosa puedo dar…”
(por Nils Brock)