Frente à crescente pressão do
Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) de fazer as rádios
comunitárias pagarem pelo uso de obras musicais, a organização de Direitos
Humanos Artigo19 e a seção brasileira da Associação Mundial de Rádios
Comunitárias (Amarc Brasil) encaminharam uma ação jurídica chamado amicus
curiae, para que se garanta a não cobrança. O documento argumenta, que o
intento do ECAD de cobrar das rádios comunitárias da mesma forma como de
emissoras comerciais, consiste em “um tratamento flagrantemente discriminatório
e restritivo” que contribui para “criminalização das rádios comunitárias, […]
violando o direito humano da liberdade de expressão”.
Exigir por meio de um amicus
curiae a intervenção dos julgadores do Superior Tribunal de Justiça não se
alimenta numa ameaça hipotética da liberdade de expressão. Segundo a
experiência de muitas rádios comunitárias brasileiras, há anos que o ECAD manda
faturas para as estações, insistindo na sua obrigação de pagar pelo uso de
áudios protegidos pelo direito do autor. Porém, tem que recordar que não se
pode geralizar essa obrigação sem levar em conta o caráter não-comercial das
emissoras comunitárias, a sua função social e as suas reduzidas fontes de
recursos, fortemente limitadas pela lei de 9612/98.
Além da existência de centenas de
exemplos, o Artigo19 e a Amarc Brasil justificam a sua ação jurídica com o caso
concreto da “Associação Comunitária Ecológica do Rio Camboriú” da qual o ECAD
cobrou pelas “transmissões ao público de composições musicais sem prévia
autorização dos titulares dos direitos autorais”. Depois ser “julgado
improcedente o pedido de cobrança” pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado
de Santa Catarina, o ECAD insurgiu-se contra essa decisão defendendo
a ideia de que o direito de autor e derivadas cobranças podem e devem
ser cobradas indiscriminadamente de todos os distintos atores radiofônicos. Mas
essa postura, segundo o Artigo19 e a Amarc Brasil ignora “que não é qualquer
uso ou exposição pública que gera a percepção de direitos autorais, pois o uso
natural e despretensioso por terceiros, para satisfação própria ou sem
fins económicos – como no caso das rádios comunitárias, não vêm por
violar direitos patrimoniais do autor”. Dito de outra forma: os autores somente
podem exigir uma retribuição se a “exposição pública é feita com objetivo de
lucro”.
Mas o caráter não-comercial
somente é uma descrição negativa, ou seja, algo que não fazem as rádios
comunitárias para demonstrar que é indevido as cobrar. Além disso, o Artigo19 e
a Amarc Brasil reconstroem também as razões da liberdade de expressão e as
concretas atividades das rádios comunitárias que justificam serem liberadas dos
pagamentos. Essa razões centram-se sobretudo na “promoção da cultura nacional e
regional” e também na “disseminação educacional”. Do ponto de vista dos
Direitos Humanos, são os Estados-Nações e as suas instituições que devem
garantir o livre exercício da radiodifusão comunitária, partindo dos princípios
da diversidade, da pluralidade e da igualdade dos meios da comunicação. Por
último, deve ser entendido ao invés de uma “igualdade” no momento de pagar
taxas, uma intervenção do Estado para “evitar a desigualdade” das
possibilidades das rádios comunitárias no seu exercício da liberdade de
expressão. Citam-se no amicus vários exemplos de legislações nacionais
que já hoje protegem melhor esses Direitos Humanos que as atuais leis vigentes
no Brasil não garantem.
Com a sua intervenção legal, o
Artigo19 e a Amarc Brasil comprometem-se com a apresentação de provas ao longo
do procedimento e exigem de forma obrigatória a “realização de sustentação oral
na sessão de julgamento”. Chamam a atenção sobre uma reivindicação que a
próprio Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) formulou para os
Estados-Nações das Américas há algum tempo: a “necessidade de sistematizar e
explicar o marco jurídico que regula e efetiva a proteção da liberdade de
expressão”
Amarc Brasil