*Arthur William
Há pessoas que reservam algumas horas de seu dia ou de sua semana para prestar um dos mais importantes serviços de utilidade pública existentes: a Rádio Comunitária. Esses pais de família, jovens e mulheres, ajudam na educação das crianças, na construção de identidades, na manutenção de sotaques, na valorização da cultura popular… Mas fazem tudo isso sem contar com apoio do poder público. Pelo contrário, a única ação dos governos é fechar essas emissoras, levando presos os voluntários que estavam exercendo um papel previsto na Constituição Federal e que raras emissoras comerciais cumprem: levar informação, educação e cultura para a população.
Hoje, no Brasil, há mais rádios comunitárias do que comerciais. Porém, isso não quer dizer que estas últimas estão em vantagem. Na verdade, as emissoras comunitárias são sinônimo de rádios pobres, de baixa potência e amadoras por culpa de uma lei, a 9.612, de 1998.
Essa lei foi criada durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em um momento nada favorável para a comunicação alternativa e popular. A lei diz mais “não” do que “sim”. Segundo o texto vigente, as rádios comunitárias não podem:
- fazer propaganda, nem do pequeno comércio, incentivando a economia local:
- transmitir para além de um quilômetro, mesmo que a comunidade seja maior;
- ter antena em altura maior do que 30 metros, mesmo que isso signifique sofrer interferências de morros e prédios;
- transmitir com mais de 25W de potência, até mil vezes menos do que as rádios privadas;
- ter mais de um canal por região, ou seja, só é possível ouvir uma rádio por local.
Além disso, foram destinadas as piores frequências para as rádios comunitárias, algumas não conseguimos ouvir em aparelhos comuns.
Outro ponto importante é a banalização do crime que a prisão de radialistas comunitários gera. Se a lei vai contra uma característica natural a qualquer ser humano, que é a capacidade de se comunicar, não adianta fechar uma rádio, pois a comunidade se une e cria outra. Assim como na questão dos downloads na internet, a criminalização de quem reivindica o direito humano à comunicação gera uma banalização do senso de crime. É ruim para um país formar uma juventude que, para exercer um direito humano fundamental, deve infringir as leis vigentes.
As rádios comunitárias chegam ao século 21 como um grande pólo que reúne as ações de comunicação de uma comunidade. Hoje, já estão se articulando com outros projetos como pontos de cultura e de mídia livre, telecentros, jornais, cineclubes e blogs: uma verdadeira central pública de comunicação.
Com a crise do velho modelo das emissoras comerciais baseado na publicidade, as emissoras sem fins lucrativos (públicas, comunitárias, educativas, culturais e universitárias) despontam como uma essencial modalidade de comunicação. Mas é preciso que as rádios tenham sustentabilidade, para sair do voluntarismo e do amadorismo, recebendo o merecido apoio do poder público.
*Arthur William é representante no Brasil da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc).