Princípios para
um marco regulatório democrático sobre rádio e TV comunitária
As
liberdades de expressão, informação e comunicação são Direitos Humanos
fundamentais garantidos por tratados internacionais, que devem ser reconhecidos
por todas as sociedades democráticas. Estes direitos, incluído o acesso justo e
igualitário aos meios de comunicação, devem se proteger e manter-se, inclusive,
no contexto das rápidas mudanças nas tecnologias da informação e da
comunicação. A liberdade de imprensa e a liberdade de antena são aspectos
chaves e indivisíveis dos direitos anteriores.
O documento
foi publicado pela AMARC América Latina e Caribe em 2009 como um guia para
elaboração, aprovação e implementação de leis sobre Radiodifusão Comunitária.
As leis devem ser compatíveis com os princípios internacionais dos Direitos
Humanos e o mais amplo respeito aos direitos à comunicação e informação e à liberdade
de expressão.
Este é o resultado da pesquisa “Melhores
práticas sobre marcos regulatórios em Radiodifusão Comunitária”, realizado em
29 países dos cinco continentes, para identificar as melhores experiências em
nível mundial. A pesquisa e validação
destes 14 pontos vêm sendo construídos desde a década de 90 com diferentes
organizações e pessoas do mundo inteiro.
CONHEÇA OS 14 PONTOS
e as justificativas:
01.
Diversidade
de meios, conteúdo e perspectivas
A diversidade e o pluralismo na
radiodifusão é um objetivo fundamental de qualquer marco regulatório
democrático. São necessárias medidas efetivas para promover a diversidade de
meios e perspectivas, o acesso aos meios de radiodifusão e o reconhecimento da diversidade
de formas jurídicas de propriedade, finalidade e formas de funcionamento, incluindo
medidas para prevenir a concentração de meios. O marco regulatório deve
explicitar o reconhecimento de três diferentes setores ou modalidades de
radiodifusão: público/estatal, comercial e social/sem fins lucrativos, onde se
incluem os meios propriamente comunitários.
02.
Reconhecimento e promoção
O
reconhecimento e diferenciação dos meios comunitários na legislação nacional
têm como objetivo garantir o direito à informação, à comunicação e à liberdade
de expressão, assegurar a diversidade e pluralidade de meios e promover este
setor. Este reconhecimento necessita ser acompanhado de procedimentos,
condições e políticas públicas de respeito, proteção e promoção para garantir
sua existência e desenvolvimento.
03.
Definição e características
As rádios e
TVs comunitárias são atores privados que tem finalidade social e se
caracterizam por serem geridos por organizações sociais de diversos tipos sem
fins de lucro. Sua característica fundamental é a participação da comunidade
tanto na propriedade do veículo como na programação, administração, operação, financiamento
e avaliação. São meios independentes e não governamentais, que não realizam
proselitismo religioso, não são de propriedade ou estão controlados ou
vinculados a partidos políticos e, tão pouco, a empresas comerciais.
04.
Objetivos e Finalidades
A razão de
ser dos veículos comunitários é atender as necessidades de comunicação e habilitar
o exercício do direito à informação e liberdade de expressão aos integrantes de
suas comunidades sejam elas territoriais, etnolingüísticas ou de interesses.
Entre outras, promover o desenvolvimento social, os direitos humanos, a
diversidade cultural e lingüística, a pluralidade de informações e opiniões, os
valores democráticos, a satisfação das necessidades de comunicação social, a
convivência pacífica e o fortalecimento das identidades culturais e sociais.
São meios pluralistas e, portanto, devem permitir e promover nas suas emissoras
o diálogo, o acesso e participação da diversidade de movimentos sociais, raças,
etnias, gêneros, orientações sexuais e religiosas, idades ou de qualquer outro
tipo.
05. Acesso tecnológico
Todas as
comunidades organizadas e entidades sem fins lucrativos têm direito a utilizar qualquer
tecnologia de radiodifusão disponível: cabo, sinais de satélite, bandas de
rádio e TV e outros sistemas que utilizem o espectro radioelétrico, tanto
analógico quanto digital. As características técnicas da emissora, no marco
legal de disponibilidade e planos de gestão do espectro, devem depender
unicamente das necessidades da comunidade a que serve e da proposta comunicacional
da emissora.
06. Acesso universal
Todas
as comunidades organizadas e entidades sem fins de lucro, sejam de caráter
territorial, etnolingüístico ou de interesses, estejam localizadas em áreas
rurais ou urbanas, tem direito a fundar emissoras de rádio e TV. Não deve haver
limites arbitrários e pré-estabelecidos referentes a: áreas geográficas de
serviço, cobertura, potência ou números de estações em uma localidade, região
ou país, salvo restrições razoáveis devido a uma limitada disponibilidade de
freqüências ou a necessidade de impedir a concentração na propriedade de meios
de comunicação.
07. Reservas de espectro
Os
planos de gestão do espectro devem incluir uma reserva eqüitativa em todas as
bandas de radiodifusão, em relação aos outros setores ou modalidades de radiodifusão,
para o acesso de meios comunitários e outros não comerciais, como forma de
garantir sua existência. Este princípio é extensivo às novas outorgas para
emissoras digitais.
08. Autoridades competentes
A
outorga de licenças, as concessões e outros aspectos do funcionamento do
Serviço de Radiodifusão Comunitária devem ser regulados por organismos estatais
independentes do governo, bem como de grupos econômicos e empresariais. Deve
ser garantida a participação da Sociedade Civil nos processos de tomada de decisões.
O devido processo e a possibilidade de recorrer suas decisões são garantias
necessárias em um Estado de Direito.
09. Procedimentos de outorga
Deve
haver concurso aberto, transparente e público como princípio para concessão de licenças,
incluindo a participação pública com mecanismos como audiências públicas. Os concursos
poderão estar diferenciados segundo os setores de radiodifusão, por meio de procedimentos
e critérios específicos, e devem levar em consideração a natureza e as
particularidades do setor dos meios comunitários para garantir-lhes uma
participação efetiva e não discriminatória. As condições das licenças, os
critérios e mecanismos de avaliação das propostas para a designação de
freqüências e os cronogramas do processo estarão regulamentados de maneira
clara e amplamente divulgados antes do início do procedimento. O processo pode
começar por iniciativa estatal ou como resposta às solicitações de atores
interessados, sempre que existirem freqüências disponíveis.
10. Requisitos e condições
não discriminatórios
Os requisitos
administrativos, econômicos e técnicos exigidos às comunidades organizadas e
entidades sem fins de lucro, interessadas em fundar meios comunitários, devem
ser aqueles estritamente necessários para garantir seu funcionamento e o mais
pleno exercício dos seus direitos. As condições das licenças não podem ser,
portanto, discriminatórias. Estas condições, bem como os critérios e mecanismos
de avaliação e os cronogramas do processo, deveriam estar estabelecidas de
forma clara e serem amplamente divulgadas antes do início dos processos.
11. Critérios de avaliação
Quando for necessária uma seleção
entre vários interessados, os critérios de avaliação devem ser diferenciados de
acordo com as diversas modalidades de radiodifusão. No caso dos meios
comunitários, a qualificação deve priorizar a pertinência do projeto
comunicacional, social e cultural, a participação da comunidade na emissora, os
antecedentes de trabalho comunitário da organização interessada e a
contribuição que a emissora fará para a diversidade na área
de cobertura. A capacidade econômica
não deve ser um critério de avaliação, no entanto, pode haver exigências econômicas
razoáveis para garantir a sustentabilidade da emissora.
12. Financiamento
Os meios comunitários têm direito de
assegurar sua sustentabilidade econômica, independência e desenvolvimento, por
meio de recursos obtidos por meio de doações, apoios, patrocínios, publicidade
comercial e oficial e outros legítimos. Todos estes deverão ser reinvestidos
integralmente no funcionamento da emissora para o cumprimento dos seus objetivos
e fins. Qualquer limite no tempo ou quantidade de publicidade deve ser razoável
e não discriminatório. Os meios devem prestar contas de forma periódica para a
comunidade, tornando transparente e pública a gestão dos seus recursos.
13. Recursos públicos
A existência de fundos públicos com
recursos suficientes deve estar disponível para assegurar o desenvolvimento do
setor de meios comunitários. É desejável que existam políticas públicas que
exonerem ou reduzam o pagamento de taxas e impostos, incluindo o uso do espectro,
para adequá-los às características e finalidade pública destas emissoras.
14. Inclusão digital
A superação da brecha digital e a
inclusão de todos os setores à Sociedade da Informação e do Conhecimento exigem
que os Estados adotem mecanismos para garantir o acesso e migração dos meios
comunitários às novas tecnologias. Os desafios da convergência dos meios e a
digitalização dos suportes analógicos devem ser enfrentados em um contexto de adaptabilidade
tecnológica e regulatória, transparência e eqüidade.