CPI do Ecad: relatório final sugere 21 indiciamentos e propõe nova lei
– A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga desde
junho, no Senado, a atuação do Escritório Central de Arrecadação e
Distribuição (Ecad) apresenta, na próxima terça-feira, seu relatório
final.O documento, a que O GLOBO teve acesso, divide-se em duas partes:
uma punitiva e uma propositiva. Na primeira, a CPI determina, entre
outros pontos, que a cúpula da entidade responsável por recolher e pagar
o direito autoral de todos os músicos do país e os dirigentes das
associações que a compõem sejam alvo de 21 indiciamentos. Entre os
crimes apontados pelos senadores Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e
Lindbergh Farias (PT-RJ), presidente e relator da CPI, respectivamente,
estão apropriação indébita de valores, fraude na realização de
auditoria, formação de cartel e enriquecimento ilícito.
Na segunda parte do relatório, que tem 350 páginas e três mil
documentos anexados, a CPI apresenta um novo projeto de lei que tira do
Ministério da Cultura (MinC) e leva para o Ministério da Justiça (MJ)
todas as questões relativas à gestão dos direitos autorais no país.
— É que o órgão controlador não pode ser economicamente menos
expressivo do que o setor a ser controlado — explica Lindbergh. — Em
2011, o orçamento empenhado do MinC foi de R$ 507 milhões, e o Ecad
arrecadou R$ 541 milhões.
— Além disso, é no MJ que estão a Defesa do Consumidor, o Cade
(Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e o combate à pirataria.
Lá tem estrutura para regular uma atividade assim — acrescenta Randolfe.
Para aumentar a transparência do sistema, a CPI propõe a criação de
uma Secretaria do Direito Autoral e de um Conselho Nacional dos Direitos
Autorais dentro do MJ. A nova estrutura administrativa, a ser gerida de
forma tripartida por representates do poder público, titulares de
direitos autorais e membros da sociedade civil, poderá regular, mediar
conflitos e fiscalizar as entidades de gestão coletiva de direitos
autorais.
A comissão sugere ainda o surgimento de uma ouvidoria independente
para tramitar reclamações do setor. Hoje, lembram os senadores, não
existe nenhuma instância pública capaz de fazer isso.
A CPI ainda quer a criação de um portal de transparência que reunirá
todas as informações referentes a receitas e despesas das entidadesde de
direito autoral. Seria algo semelhante ao que a Controladoria Geral da
União (CGU) faz com os gastos públicos hoje em dia.
— Também propomos o fim do sistema de amostragem, usado pelo Ecad
para fazer suas cobranças e repasses — destaca Randolfe. — Propomos que
todas as rádios e TVs do país divulguem trimestralmente em suas páginas
as músicas que realmente usaram.
— Segundo o novo projeto, quem fixa o preço do direito autoral é o
autor e sua associação — ressalta Lindbergh. — A exemplo do que acontece
nos Estados Unidos, se houver divergência entre o usuário e a
associação, o MJ vai homologar o preço final. O Ecad deverá ser apenas
uma secretaria executiva dos titulares de direitos autorais. Quem manda é
o autor.
Hoje, o valor cobrado é fixado pelo Ecad (após aprovação de sua assembleia) e só pode ser questionado judicialmente.
O projeto de lei também promete mudar a estrutura da gestão do
direito autoral no Brasil. Atualmente, as associações misturam
compositores, cantores, produtores. A CPI quer que elas se dividiam por
categoria. E, para poder funcionar, a associação deverá vencer licitação
feita pelo MJ a cada cinco anos.
No texto final, a CPI também pede ao Cade que “promova o rápido
julgamento” e “a efetiva condenação” do Ecad e das associações por
“infração da ordem econômica”. Desde agosto, o órgão investiga a
estrutura por práticas de cartel.
Ecad rebate
Procurado, o Ecad rebateu as acusações que embasam os 21 indiciamentos propostos pela CPI do Senado.
Com relação à suposta apropriação indébita de 2004, lembra que seu
regulamento “prevê que ao final de cinco anos, caso os créditos retidos
não sejam identificados, a assembleia geral pode decidir seu destino”.
Sobre fraude em auditoria, diz que, em 2009, contratou a BDO Trevisan
mas que, diante da lista de documentos que lhe “pareceram
desnecessários” apresentada pela empresa, decidiu distratá-la em favor
da Martinelli Auditores.
Sobre o suposto enriquecimento ilícito de seus administradores, o
Ecad informa que seu Programa de Participação nos Resultados “foi criado
por uma empresa especializada e é auditado constantemente por empresas
de auditoria externa”. E, quanto à suposta prática de cartel, destaca
que o Ministério Público emitiu parecer “manifestando-se pelo
arquivamento do processo por inaplicabilidade do direito concorrencial”.
Sobre o novo projeto de lei, o Ecad diz não ser “contrário a qualquer
supervisão, desde que seja técnica, sem viés politico, dentro dos
limites constitucionais, e que preserve o direito do autor de fixar o
preço pela utilização de sua obra”.
O relatório final será votado na quinta-feira e apresentado à
Procuradoria Geral da República, à Casa Civil e ao Ministério da
Justiça. Para o mesmo dia, está previsto um ato da Frente Parlamentar de
Cultura em apoio ao documento no salão nobre da Câmara.
Informações: O Globo