RÁDIOS LIVRES
Os estudantes da USP e a crítica à
legalidade
Por Rodrigo Neves
“A rádio Várzea é um espaço de resistência,
mas, sobretudo, de reexistência. Não estamos apenas interessados em negar esse
sistema moribundo, nossa luta também é propositiva, da reinvenção da vida, da
transmissão criativa”.
É dessa maneira que a rádio Várzea Livre se
descreve em um dos seus vários manifestos. Ocupando a frequência 107,1 FM, hoje
só é possível ouvi-la dentro do prédio da História e Geografia, na Universidade
de São Paulo. Há pouco mais de um ano, era possível escutá-la por toda a
universidade, até a Marginal do Rio Pinheiros.
A rádio livre foi criada por estudantes da
USP em 2002, durante uma greve por melhores condições de ensino. Desde então, a
Várzea é autogerida por estudantes de distintas unidades da USP, emitindo sua
programação a partir de uma pequena sala na Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas (FFLCH).
A radiodifusão livre se diferencia das rádios
comunitárias por ocupar ilegalmente o espectro eletromagnético, enquanto as
outras necessitam ser institucionalizadas e seguir as regras ditadas pela Lei
nº 9612, de 1998, que institui o Serviço de Radiodifusão Comunitária. A lei
estabelece a necessidade de que as rádios comunitárias apresentem um estatuto,
eleição de diretores e declaração assinada por cada um deles.
Existe um motivo político para não se
institucionalizar. Para os responsáveis pela rádio Várzea, ocupar o que chamam
de “latifúndio eletromagnético” é uma forma de protestar contra a concentração
da mídia. “A rádio livre é uma ferramenta de luta social”, diz um dos alunos
que participa da emissora. “O principal é quebrar o modelo
‘transmissor/receptor’, tornar todos mais envolvidos, fazer com que todo mundo
possa se comunicar livremente”, conclui.
Silvio Mieli, professor de jornalismo da
PUC-SP, concorda que as rádios livres são uma frente de luta que deve existir
e, às vezes, esta é a única opção que resta. “A impressão é que gastamos muita
energia com o movimento pela ocupação do espectro eletromagnético, mas
quantitativamente não conseguimos muito”, diz ele. “Às vezes a ocupação do
jeito que é acaba sendo mais rica só por criar uma interação com a realidade à
sua volta.”
Produção e repressão
Desde sua criação, há 10 anos, a história da
rádio Várzea se confunde com as diversas mobilizações estudantis e os avanços
repressivos. Em 2007, suas transmissões foram feitas dentro do prédio da
reitoria da USP, ocupado por estudantes em greve. Em 2006, a rádio Várzea
invadiu a frequência da rádio Bandeirantes para a leitura de um manifesto em
defesa das rádios livres e contra a concentração dos meios de comunicação. O ato
resultou em uma denúncia, a Polícia Federal foi chamada à FFLCH e o transmissor
da rádio foi confiscado.
No entanto, os participantes da rádio
entrevistados pelo Observatório são unânimes em concordar que o pior
golpe aconteceu em 2011. Durante a greve estudantil contra a presença da
Polícia Militar no campus, a TV Band fez uma matéria sobre a mobilização dos
estudantes e relembrou o caso de 2006, quando houve a invasão da frequência da
rádio do grupo. Logo depois, a antena da Várzea foi retirada pela diretoria da
FFLCH. Hoje, a antena só pode estar instalada dentro de uma sala, restringindo
a transmissão da rádio. Os alunos já tentaram utilizar a transmissão online,
mas também enfrentaram dificuldades com a rede de internet da USP.
Apesar disso, os alunos participantes da
rádio continuam oferecendo oficinas de radiodifusão para movimentos sociais,
como o MST. “É mais interessante multiplicar as rádios livres do que aumentar o
alcance do nosso sinal”, diz um dos alunos. “O importante é que as pessoas aprendam
a técnica.”
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[Rodrigo Neves é estudante de Jornalismo da
ECA-USP]