Escrito por: Mabel Dias
Fonte: Carta Capital
Fonte: Carta Capital
Campanhas
publicitárias, enquetes jornalísticas reforçam o desrespeito e incentivam o
estupro no período.
Em
pleno carnaval, onde se registra um aumento nos casos de violência, a cerveja
Skol lançou uma campanha publicitária que trata as mulheres – mais uma vez –
sem opinião própria e a mercê dos homens. A campanha traz frases como
“Esqueci o não em casa”, “Topo antes de saber a pergunta”, entre outras,
espalhadas em outdoors na cidade de São Paulo.
As
frases chamaram a atenção da publicitária Pri Ferrari e da jornalista Mila
Alves, que com um olhar crítico e atento, observaram que a campanha incentivava
a perda de controle, em um período onde se registra um alto índice de estupros.
Elas decidiram então fazer intervenções nos materiais, acrescentando outras
palavras para reforçar o respeito às mulheres e o não a violência.
A
reação e intervenção de grupos feministas conseguiu constranger a referida
marca de cerveja, que se viu obrigada a retirar a campanha das ruas paulistas.
Uma vitória das mulheres, ainda que o Conselho Nacional de Autorregulamentação
Publicitária - CONAR - não tenha nem se manifestado a respeito.
A
máxima no imaginário popular e machista é que, quando uma mulher diz “não”, ela
está querendo dizer “sim”. Isso é usado como justificativa para os crimes de
violência, entre eles o de estupro, que acontecem com mais intensidade no
carnaval.
Outra
violência que ocorre neste período são os beijos forçados nos blocos,
considerado estupro pela legislação brasileiro. Mesmo assim, a afiliada da Rede
Globo na Bahia lançou uma enquete em um de seus telejornais perguntando se o
beijo forçado devia ser proibido ou não. Não é possível aceitar este tipo de
posicionamento vindo de um veículo que forma opinião.
A
enquete também chegou às redes sociais e repercutiu negativamente. A deputada
federal Jandira Feghali (PC do B-RJ), por exemplo, afirmou que “este é o tipo
clássico de jornalismo que só ajuda a agravar mais o machismo da sociedade e a
visão da mulher como posse do homem".
Sobre
a intervenção na campanha da Skol, Pri Ferrari postou a ação em seu facebook,
que teve mais de 20 mil curtidas e quase 8.000 compartilhamentos! A iniciativa
chegou até a AMBEV, responsável pela fabricação da cerveja. O diretor da
empresa ligou para a publicitária informando que iriam montar uma força tarefa
para retirar todas as peças publicitárias de circulação.
Porém,
os estereótipos construídos pelas propagandas de cervejas não tem só na Skol
seu exemplo. Já são incontáveis a quantidade de ações de grupos feministas
contra o machismo nas peças publicitárias. A marca Itaipava, desde o mês de
janeiro, traz explicitamente a mulher como mercadoria em sua propaganda. As
cenas são as clássicas do machismo: uma mulher que pouco fala, dona de um bar,
vestida com roupas minúsculas, que serve aos homens e que tem o nome de
“Verão”, em uma alusão a estação do ano.
No
texto “A cerveja e o assassinato do feminino, a doutora em Sociologia da
Universidade de Brasília (UNB), Berenice Bento, afirma que “nesses comerciais
não há metáforas. A mulher não é "como se fosse a cerveja": é a
cerveja. Está ali para ser consumida silenciosamente, passivamente, sem esboçar
reação, pelo homem. Tão dispensável que pode, inclusive, ser substituída por
uma boneca de plástico, para o júbilo de jovens rapazes que estão ansiosos pela
aventura do verão".
Berenice
Bento considera que, mesmo com a luta do movimento feminista, ao pautar a
violência contra as mulheres como uma das piores mazelas, a estrutura
hierarquizada das relações entre os gêneros ainda é muito presente. Revela as
múltiplas fontes que alimentam o ódio ao feminino.
As
campanhas publicitárias das cervejas no Brasil retratam bem isso. E não se pode
dizer que isso é natural ou uma “brincadeira”. É o retrato do machismo que mata
mulheres e meninas. Retrato de uma sociedade que precisa ser transformada, e
que atitudes como as de Pri Ferrari e Mila Alves, ou como das mulheres da Rede
Mulher e Mídia, que estão sempre atentas e combativas às violações à imagem da
mulher na mídia.
*Mabel Dias é jornalista e integrante do Intervozes