Os técnicos do Ministério das
Comunicações encontraram uma nova forma de “criminalizar” as rádios
comunitárias em busca de autorização e as que buscam a renovação da outorga:
estão buscando nos TRE e TSE informações sobre filiação partidária dos dirigentes
das entidades das emissoras. Se encontram o nome de algum dos dirigentes da
rádio, tá perdido! É arquivamento na hora!
Senão, vejamos:
O negociado e aprovado no Congresso
Nacional
Não é novo o modo dos “técnicos” do
Ministério das Comunicações – MC interpretarem a legislação da radiodifusão
comunitária. Participei ativamente da negociação para a aprovação da Lei
9612/98 na Câmara dos Deputados nos anos de 96/97. Foi dificílima a discussão.
Nossa proposta previa até 300 w de potência e a proposta do Governo FHC era de
raio de 01 quilômetro. Trocamos os 300w por 25w sem a limitação de 01km.
Aceitamos a negociação tendo-a como lei mínima, apenas para criar o serviço de
radiodifusão comunitária e as comunidades pudessem sair da ilegalidade imposta
pelo governo.
A Lei foi aprovada e sancionada em
fevereiro de 1998.
O Raio de 01 km
Pois bem, tal não foi a nossa
surpresa quando os “técnicos” do MC recuperaram o tal de raio de 01 km na regulamentação
da lei. E esse raio de 01 km proporcionou várias das dificuldades enfrentadas
pelas rádios comunitárias atualmente. Foi baseado nessa regulamentação
traiçoeira, já que nós havíamos derrubado esse raio no Congresso Nacional, que
o governo passou a regular tudo que diz respeito às rádios comunitárias,
causando transtornos de choques de frequências e criação de sombras de sinal
para grande parte dos territórios abrangidos pelas emissoras. Um iluminado do
MC determinou, como a abrangência de uma emissora era de 01 km, o governo
poderia habilitar emissoras a cada 04 quilômetros. A proposta do movimento era
criar emissoras municipais para promover a produção cultural, artística e
jornalística local. Por isso conseguimos garantir na lei que nas localidades
onde tivessem mais de uma entidade interessada, a que tivesse mais
representatividade é que receberia a autorização. E essa representatividade
deveria ser de acordo com o numero de associados/filiados e que seria
obrigatória a junção em caso de empate nesse quesito.
A representatividade
Pois os “técnicos” não acharam outra
interpretação para representatividade? Determinaram que as entidades teriam que
fazer “abaixo assinado” para apresentarem uma “lista de apoiadores” e não
apresentarem a relação de seus associados.
E… quem saiu ganhando com essa
interpretação? Os que não queriam entidades democráticas e representativas. Os
que tinham facilidade de colocarem os formulários na entrada das atividades e
seus fiéis assinarem. Os que podiam contratar offices boys para coletar
assinaturas nas ruas e assim por diante.
Com isso, por mais associados que a
entidade tenha não tem a representatividade de uma microempresa disfarçada de
entidade sem fins lucrativos que tenha uma “lista de apoiadores” com maior
número de assinaturas.
A subordinação
Acabou? Ainda não.
Acharam outra forma de perseguir as
rádios comunitárias apenas com a “interpretação” da Lei. Agora sobre a sua
subordinação a terceiros.
O Movimento conseguiu incluir na lei
o artigo 11, para tentar limitar apropriação das emissoras pelas instituições
já constituídas, pois a intenção era que fossem concedidas autorizações para
entidades criadas para o fim específico de radiodifusão comunitária. Não foi
possível manter esse texto na lei e atualmente nós temos rádios comunitárias
funcionando como departamentos de uma associação de moradores, uma ong, uma
fundação qualquer, completamente vinculadas e submetidas à coordenação de outra entidade. Isso vai
contra o artigo 11 da Lei 9612/98.
Mas, os “técnicos” responsáveis pelas
“notas técnicas” do MC encontraram outra interpretação. A de que nenhum dos
dirigentes da entidade da radio comunitária pode ter uma filiação partidária.
Ou seja, a simples filiação ao partido de um dirigente da entidade já
caracteriza “vinculação e submissão à gerência do partido”.
Agora vejam o que diz o artigo 11:
“Art. 11 A entidade detentora de
autorização para execução do Serviço de Radiodifusão Comunitária não poderá
estabelecer ou manter vínculos que a subordinem ou a sujeitem à gerência, à
administração, ao domínio, ao comando ou à orientação de qualquer outra
entidade, mediante compromissos ou relações financeiras, religiosas,
familiares, político-partidárias ou comerciais.”
Agora a definição do serviço:
“Art. 1º Denomina-se Serviço de
Radiodifusão Comunitária a radiodifusão sonora, em frequência modulada, operada
em baixa potência e cobertura restrita, outorgada a fundações e associações
comunitárias, sem fins lucrativos, com sede na localidade de prestação do
serviço.
1º Entende-se por baixa potência o
serviço de radiodifusão prestado a comunidade, com potência limitada a um
máximo de 25 watts ERP e altura do sistema irradiante não superior a trinta
metros.
2º Entende-se por cobertura restrita
aquela destinada ao atendimento de determinada comunidade de um bairro e/ou
vila.”
Agora vejam a pérola da interpretação
política dos “técnicos” do MC:
“I – As Rádios Comunitárias foram
criadas com o intuito de assegurar à população os direitos de comunicação, de
expressão e de acesso à informação, da forma mais abrangente e isenta possível.
Nesse sentido a Lei 9.612/98, determinou que esse serviço fosse prestado por
Assoc. ou Fundações s/ fins lucrativos, apartidárias e livres de qualquer tipo
de proselitismo ou sectarismo, Não apenas isso, a Lei buscou também impedir que
entidades de caracter partidário, religioso ou de outro modo incompatível com
as finalidades do serviços, viessem de modo indireto, a controlar uma rádio
comunitária , por meio de influência aberta ou velada exercida sobre a assoc.autorizada.
Compreende-se a partir daí, que o vinculo é mácula processual das mais graves,
visto que a matéria afeta a própria legitimidade da requerente pleitear a
outorga. Vê-se portanto que ao contrário do que diz a recorrente, não está a
discutir a possibilidade ou não de a entidade praticar proselitismo caso venha
a ser autorizada, mas sim os pressupostos da legitimidade da associação para
concorrer ao certame. Em outras palavras trata-se de saber se a entidade tem ou
não o direito de participar da seleção pública. por óbvio é impossivel apreciar
a adequação da programação de uma entidade que ainda não está outorgada.
II – O vínculo se estabelece de duas
maneiras: pode ocorrer por meio de instrumentos formais que submetam a entidade
à administração ou à ingerência de outra; ou por forma menos ofensiva quando
uma entidade detem o poder de influenciar a outra, exercendo comando, domínio
ou orientação, neste caso a vinculação costuma ser detectada pela análise das
circunstâncias que envolvem o relacionamento entre a subordinante e a
subordinada.
III – neste sentido as fortes
evidencias de que esta assoc. mentém vinculos políticos partidários permite
concluir com segurança que a requerente não tem legitimidade para participar do
certame. Isso não só pela filiação partidária mas também pela candidatura a
cargos eletivos e participação direta em órgãos partidários, e essas posições
são incompatíveis com a direção de uma rádio comunitária, ferindo o artigo 11
da Lei 9.612/98.
IV – Por fim, salienta-se que em
momento algum o direito a livre associação foi obstruído pela ação do Poder
Público, pois a entidade não foi impedida de continuar funcionando. Compete ao
poder concedente zelar pela outorga dos serviços de radiodifusão de acordo com
a lei, portanto esta assoc. não está apta a participar do certame por manter
vinculo que a subordina à orientação político-partidária.
Diante do exposto a coord. geral de
radiodifusão comunitária posiciona-se pelo não acatamento do recurso
administrativo e os autos devem ser arquivados, restando a requerente aguardar
novo aviso de habilitação.”
Diante dessa situação a Direção
Executiva da Abraço Nacional vem de público denunciar mais essa forma de
perseguição às rádios comunitárias pleiteantes de autorização e em processo de
renovação de outorga, exigindo que o Ministro das Comunicações Ricardo Berzoini
reveja mais essa forma de criminalizar as rádios comunitárias envolvidas na
luta pela democratização da comunicação e do país.
José Luiz do Nascimento Sóter
Coordenador Executivo da Abraço
Nacional