Se alguém tinha dúvidas sobre o caráter autoritário do governo Michel
Temer, sua última decisão acaba com elas. Antes de embarcar para a China, o
ex-vice de Dilma Rousseff deixou uma tarefa para Rodrigo Maia (DEM-RJ), o
presidente licenciado da Câmara dos Deputados e presidente da República
interino: Em uma canetada, extinguiu, por medida provisória, o Conselho Curador
da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e exonerou seu diretor-presidente,
Ricardo Melo, para colocar em seu lugar Laerte Rimoli, um indicado de Eduardo
Cunha.
A decisão foi publicada nesta sexta-feira (2) no Diário Oficial da
União, e já passa a valer. Esta não é primeira vez que isso acontece. Em maio,
logo após o afastamento temporário de Dilma, Temer trocou Melo por Rimoli,
causando repúdio em entidades como Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj),
e motivou uma representação criminal enviada por um grupo de deputados ao
procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Ao nomear Rimoli, Temer ignorou a lei 11.652/2008, que autoriza a
criação da EBC e garante o mandato de quatro anos ao presidente nomeado,
independentemente da troca de governos. Na primeira vez que chegou lá por via
ilegal, Rimoli demitiu mais de 50 pessoas e fez bruscas mudanças na grade de
programação, tornando-a simpática ao então governo interino, ao proibir, por
exemplo, o uso do termo “presidenta” para se referir a Dilma Rousseff.
Aliado de Cunha, Rimoli era assessor da secretaria de comunicação na Câmara
dos Deputados e coordenou a equipe de comunicação da campanha presidencial do
senador Aécio Neves (PSDB-MG) em 2014.
Já papel do conselho, diz a lei que o rege, é – justamente – “zelar
pelos princípios e autonomia da Empresa Brasil de Comunicação, impedindo que
haja ingerência indevida do Governo e do mercado sobre a programação e gestão
da comunicação pública“.
Quando destituiu Melo, o Conselho Curador – agora extinto – publicou a
seguinte nota: “Ao longo do intenso debate público que levou à criação da EBC,
firmou-se a concepção de que o diretor-presidente deveria ter mandato fixo, não
coincidente com os mandatos de Presidentes da República, para assegurar a
independência dos canais públicos, tal como ocorre nos sistemas de radiodifusão
pública de outros países democráticos”, diz a nota. “A exoneração do
diretor-presidente da EBC antes do término do atual mandato viola um ato
jurídico perfeito, princípio fundamental do Estado de Direito, bem como um dos
princípios específicos da Radiodifusão Pública, relacionado com sua autonomia
em relação ao Governo Federal.”
A importância da comunicação pública e sua defesa são superiores aos
interesses político-partidários, conforme determina o manual de redação da EBC,
criado de maneira colaborativa e pública.