Por Ana Claudia Mielke*
Recentemente fui convidada a participar de uma entrevista no
programa VerTV, da TV Brasil, para falar do tema do arrendamento, isto é, a
venda ilegal, de grades da programação de TV.
Respondi prontamente que falava do tema, mas indiquei um colega
que também compõe o Intervozes, por achar que, na posição de advogado, ele
estaria mais preparado para realizar este debate.
Ouvi a seguinte resposta do produtor:
“mas nós queremos uma mulher, preferencialmente negra, participando do programa
no estúdio”.
Fiquei surpresa, porém, bastante contente com a ação.
Contei esta história para introduzir um debate necessário, que é o
papel da comunicação pública na promoção da diversidade étnico-racial.
Embora muitas tenham sido as análises sobre o papel dos meios de
comunicação comerciais na representação negativa ou positiva da negritude, em
especial neste mês de novembro, em que se celebra a consciência negra, poucas têm sido as reflexões sobre como isso se
dá nos veículos de comunicação pública.
Em relação aos meios comerciais, verificamos, ano após ano, que os mesmos
seguem mantendo uma postura racista ao não incorporar negros e negras de
forma mais contundente em sua programação.
Por forma contundente entende-se em quantidade proporcional ao que
figura na sociedade brasileira e com a qualidade e o respeito devido a esta
população, promovendo a representatividade positiva e não a colocando
exclusivamente em papéis historicamente tidos como de subalternidade (escravos,
bandidos, domésticas, “mulatas”).
A televisão é quase sempre a mais criticada, não por acaso, já que
tem um poder de penetração ainda muito superior aos demais dispositivos de
mídia – a TV aberta chega 97,2% das residências brasileiras, segundo a PNAD de
2012.
Fazendo uma comparação rápida, a internet chega a pouco mais que
em 50% dos lares segundo a última pesquisa TIC Domicílios feita pelo Comitê Gestor da Internet. Além disso,
a televisão é uma mídia fundamentalmente audiovisual.
Seria difícil analisar a cor/raça de jornalistas, especialistas e
articulistas que atuam diariamente nos jornais impressos, embora suspeitemos
que a ausência de negros e negras aí também deva ser
relevante.
Mas retornemos à comunicação pública. Em diálogo com pessoas que
ocupam ou ocuparam cadeiras da sociedade civil no extinto Conselho Curador da
Empresa Brasil de Comunicação (EBC), soube que a ideia de
promover a participação de mulheres, negros e de transexuais nos veículos da
empresa vinha sendo debatida nas reuniões do órgão.
Um dos documentos usados como base era o Indicadores de Perspectiva de
Gênero para a Mídia, produzido pela Unesco e a ONU, em 2012. E a própria
composição do Conselho Curador, que prevê representação de grupos específicos,
com recorte de gênero e raça, é um elemento determinante para que estas
questões de inclusão e participação sejam pautadas.
Embora não haja uma política institucionalizada de ações
afirmativas para a população negra nos veículos da EBC, os exemplos trazidos
aqui demonstram que existe, sim, uma preocupação, por parte de alguns
funcionários e diretores, em promover maior diversidade na programação.
Esta perspectiva é o que possibilitou, por exemplo, que a emissora
tenha conseguido emplacar o primeiro programa LGBT (o único na TV aberta brasileira) apresentado por uma
transexual, a Candy Mel.