domingo, 13 de fevereiro de 2011

Conteúdo é tudo


Dioclécio Luz

Uma das grandes falhas do movimento – ou de algumas de suas lideranças – é não dar a importância devida ao conteúdo da emissora. Para algumas pessoas basta ligar o transmissor que a emissora é comunitária. A questão, porém, queiramos ou não, é que a comunicação existe para quebrar o latifúndio da comunicação. E para fazer isso tem necessariamente que oferecer uma nova programação. Conteúdo é tudo.

Mirem-se no exemplo dos Sem-Terra. O MST sabe que não basta ocupar a terra e plantar qualquer coisa. Ele sabe que é preciso mudar o modelo agrário nacional – o lema é “um Brasil sem latifúndio”. Este também é (ou deveria ser) o nosso lema. Não conseguiremos mudar muita coisa se for aceito o latifúndio e a gente se contentar com um canal fuleiro, fora do dial, com alcance de 1 Km. Enquanto o latifúndio da comunicação se manter, não haverá democratização dos meios de comunicação. Mas para que ocorra esta mudança é preciso que as emissoras comunitárias estejam afinadas nessa luta. E que luta!... O latifúndio da comunicação é muito mais poderoso do que o da terra. E se a gente não tiver conteúdo na programação não vai fazer a mudança. Rádio comunitária “é mais, é mais, é mais além”, já disse o cangaceiro Lenine.

A saída, portanto, está nas bases. Cada rádio comunitária ou rádio livre, deve ficar ciente do seu papel. E montar programações que questionem o modelo atual: a política de comunicação, a indústria cultural, o jornalismo da grande imprensa. É preciso que surjam novas lideranças, inclusive. A partir das bases. E que elas – com o lastro do reconhecimento dessas bases – possam construir o novo tempo.

É o tempo dos movimento sociais organizados saírem pro mundo. Instigarem seus povos e povas a montarem rádios e TVs comunitárias, e rádios livres. E que eles determinem os princípios das rádios comunitárias. Neste momento, pelo menos, esqueçam a lei vagabunda em vigor: o povo é soberano para construir sua base. Juntem-se a entidades decentes e vamos em frente.

O novo tempo é um desafio, uma faca amolada, duas lâminas: temos medo do novo; mas ficamos felizes porque podemos fazer algo completamente novo. Sonhar é permitido. Ou a gente faz algo novo, sonhado por nós, pensado por nós, ou, mais uma vez eles vão chegar, e, no lugar do jardim vão criar porcos – a programação da rádio vai ter TV Globo, e a gente vai achar normal. Este é o sonho deles, e a nossa dor. O nosso sonho é outro. Ou a gente faz nascer este sonho nosso, ou a gente desiste de sonhar.

Nós, apesar de nossa pobreza material, somos maiores que eles. Por isso, nesse novo tempo, apesar de tudo, apesar dos perigos, resistimos. Existimos. Atenção fariseus: não subestimem a dor que cria. Esta dor é não-cristã: Paulo Leminski já disse: O homem com uma dor, é muito mais elegante, caminha assim de lado, como se chegando atrasado chegasse mais adiante"...